Interior de SP
"Economia Verde" promove ciclo sustentável no Centro de Ressocialização de Jaú
Projeto reúne trabalho de reeducandos do regime semiaberto e alimentação saudável
Por Marcos Ferreira | Redação
Desde sua fundação, em junho de 2003, o Centro de Ressocialização de Jaú conta com equipamentos e espaços que auxiliam no propósito de apoiar a recuperação de pessoas em privação de liberdade do regime fechado, semiaberto e custódia provisória.
Junto às três alas que compõem a unidade prisional, há oficinas de trabalho, quadra poliesportiva, cozinha, padaria, refeitório e lavanderia. Existem ainda salas de aulas onde acontece a aplicação de disciplinas do ensino fundamental e médio, além da realização de cursos profissionalizantes.
O CR inclui características que condizem com o município onde está localizado. Jaú fica no noroeste do estado de São Paulo, em uma região de terra fértil, o que contribuiu no passado para que a cidade se tornasse um dos principais centros produtores de café do país. Hoje, predomina na economia jauense a agricultura da cana-de açúcar. O setor ocupa 94% do território, de acordo com dados da prefeitura.
Fora a cana de açúcar, o trabalho rural é algo comum em Jaú. Na unidade prisional não é diferente. Na parte externa do CR há uma pequena horta repleta de hortaliças, ervas e vagens, utilizadas em refeições que são servidas para os internos e funcionários. Em dia de visitação, os pratos também são oferecidos aos familiares.
O teor sustentável já estava na essência de todo o ciclo. Em 2021, a ideia ganhou mais força com o projeto “Economia Verde”. O espaço destinado ao cultivo de vegetais foi ampliado e aprimorado, possibilitando a realização de um curso no qual os reeducandos executam trabalhos em equipe e desenvolvem habilidades com o manejo da terra.
Outro pilar fundamental alcançado com a iniciativa, que conta com o entusiasmo da Dra. Vera Lucia da Silva, diretora geral do CR de Jaú, foi a promoção do pensamento consciente em relação à importância de uma alimentação saudável e livre de resíduos químicos e agrotóxicos. Atuando diretamente no plantio, trato e colheita, os apenados passaram a obter diversos conhecimentos práticos sobre o tema, e sentindo no próprio organismo as vantagens de uma dieta rica em produtos naturais.
Em aproximadamente 200 metros quadrados, foram construídos 12 canteiros, cada um medindo cerca de 1 metro quadrado de largura por 17 metros de comprimento. Nesse espaço são produzidos itens necessários para uma alimentação balanceada, como alface, rúcula, cenoura, berinjela, entre outros.
Tudo que é produzido beneficia em torno de 220 reeducandos e mais de 30 servidores, que contam com um cardápio variado ao longo de toda a semana.
“Graças ao curso aplicado, estamos conseguindo oferecer uma alimentação mais saudável e diversificada, introduzindo no cardápio da unidade uma variedade de saladas compostas por verduras e legumes”, conta Marcos Antonio dos Santos, proponente do projeto e responsável pelo Setor de Trabalho e Educação do Centro de Ressocialização de Jaú.
Para isso ser possível, o CR contou com o apoio da Secretaria de Agricultura do município, que disponibilizou um profissional hortelão para ministrar aulas semanais a uma turma de 10 recuperandos do regime semiaberto. Outro parceiro é o Instituto Ação Pela Paz, que, por meio do SEMEAR *, contribuiu com o apoio estrutural do programa, viabilizando a aquisição de produtos, insumos e ferramentas. A organização também destinou uma equipe para o monitoramento e avaliação do projeto.
O “Economia Verde” possui uma oficina para a capacitação profissional dos participantes. A grade traz conhecimentos para o preparo dos canteiros, distribuição de matéria orgânica e fertilizante, homogeneização, nivelamento, semeadura, transplante de mudas, adubação, controle de pragas, manuseio de matéria orgânica, medição e montagem de estufa, utilização correta de sombrite, compostagem, colheita, higienização e técnicas de armazenamento.
Ao decorrer das etapas houve o cuidado em desenvolver multiplicadores, que terão a responsabilidade de dar continuidade ao formato com novas turmas.
Resultados diversos
Esse processo sustentável vai além do que compõe o café da manhã, almoço e jantar. O desenvolvimento de novas habilidades abre oportunidades de trabalho para o participante quando esse ganhar liberdade, mas ainda dentro da prisão é possível notar avanços significativos.
“Eu que acompanho diariamente os trabalhos dos reeducandos, pude notar que os ensinamentos aplicados durante o curso trouxeram uma nova oportunidade e uma nova visão de como produzir seus próprios alimentos”, completa Marcos Antonio.
A questão comportamental
“Uma nova profissão para minha vida, estou feliz”, diz um reeducado que participou do curso. A opinião dele condiz com os índices de pertencimento, cognição e superação analisados pelas equipes de monitoramento. Todos os alunos acreditam que o projeto colaborou para a melhora no convívio e fortalecimento de vínculos com os companheiros da unidade e afirmam que o conteúdo aplicado contribuiu para o desenvolvimento de novas habilidades.
“Em relação à disciplina, podemos dizer, com certeza, que o trabalho em grupo trouxe uma nova experiência de poder conviver juntos em busca de um novo objetivo, desde a preparação do solo à colheita das verduras”, avalia Marcos.
A turma, de forma geral, enxerga que o “Economia Verde” colabora com o processo de recuperação de quem esteve envolvido nas atividades. Não à toa, mais de 90% mostraram interesse em seguir como multiplicadores do projeto. “Dever cumprido, pronto para passar os conhecimentos”, conclui um aluno.
Novas hortas
Outras unidades prisionais também apostam em formatos próximos. No CR de Limeira, uma horta comunitária foi iniciada no mês de maio. O projeto é uma ação conjunta entre diretor da unidade penal, conselho da comunidade, juiz local, Instituto Ação Pela Paz e SENAI.
Um evento no dia 11 marcou o início dos trabalhos e contou com a presença do prefeito Mario Botion e outras autoridades do município. Os secretários Simone Zambuzi (meio ambiente e agricultura) e Jorge de Freitas (habitação), a presidente do Ceprosom, Maria Aucélia Damaceno, o presidente da câmara, vereador Sidney Pascotto, o diretor do CR, Fernando Pedro, o juiz corregedor das Execuções Penais de Limeira, Guilherme Lopes Lamas, e o coordenador das unidades prisionais, Jean Ulisses Campos Carlucci, entre outras autoridades estiveram na cerimônia.
Veja matérias sobre esse projeto em nossa página de imprensa.
* Programa SEMEAR
Semear (Sistema Estadual de Métodos para Execução Penal e Adaptação Social do Recuperando) foi criado em 2014 por meio do provimento da Corregedoria Geral da Justiça do Tribunal de Justiça de São Paulo e tem como parceiros a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária e o Instituto Ação pela Paz. O programa busca maior efetividade na recuperação dos presos e suas famílias.